Comportamento, ciência, tecnologia, direito, política, religião, cinema e televisão, alguma controvérsia, algum bom senso, e um pouquinho de besteira, para dar um gostinho...

17 de jul. de 2017

36 anos e mais um semestre

Minha vida acadêmica não foi um completo desastre. Veja bem, completo. Um desastre ela foi, sem dúvida nenhuma. Muito dinheiro, tempo e esforço foram investidos em 3 cursos superiores, e nenhum deles foi concluído. Não foi completo (o desastre) pois muitas lições foram aprendidas, muita experiência foi ganha e não estaria onde estou não fosse tudo ter acontecido exatamente como aconteceu.

E mais um aniversário passou. Talvez pelo ano de 2017 ser especial, esse ano eu tive "consciência" da passagem do tempo. Corpo mais frágil, mente mais inquieta. Adentro o último semestre do meu curso. Será? Eu, com 36 anos na cara, finalmente vou ter um diploma universitário? Sim. Muito esforço no Trabalho de Conclusão de Curso, muitas ideias, aulas e provas ainda, mas eu tenho convicção que dessa vez vai. Primeiro pois as coisas estão encaminhadas. O projeto do Trabalho de Conclusão foi apresentado com sucesso, implementadas mudanças, melhorada a metodologia. O desenvolvimento já tem espaço de tempo separado, férias do serviço planejadas para dedicar randômicas horas diárias a concluir o projeto. As coisas estão andando como se fossem terminar, e falta bastante tempo. Ao contrário das outras vezes, quando faltar mais de uma semana era motivo para não planejar nem fazer nada. Sim, eu tive minha parcela fatal de culpa no fracasso acadêmico.

Faltam 100 dias letivos.

26 de mai. de 2017

Viagens e lições

Faz uma semana que voltei da minha última viagem. Foi o mais longe que fui até hoje, e foi um dos lugares mais lindos que já vi. Em sua própria categoria, claro. Fui para Recife. De lá fomos para as praias de Maragogi, Porto de Galinhas e Carneiros.

Apesar da beleza natural, o que mais me chamou a atenção foram as pessoas. Então, antes que a memória enfraqueça, quero deixar registrada a experiência e o que eu aprendi com ela.

Em Maragogi conheci o Luan, um bugueiro (motorista de Buggy) de 17 anos, que se descreve como um ótimo fotógrafo. Nos levou para conhecer a praia de Maragogi. Ele trabalha a 7 meses com isso, todos os dias levando turistas para conhecer as belezas do lugar que ele chama de lar. Em um Brasil em que a educação profissional não preza tecnologia, e onde o acesso a esse tipo de formação é tão escasso, uma atividade como essa envolve profissionais tão diferentes entre si. Ilustro: em Porto de Galinhas conheci o Leo. Não foi (infelizmente) o nosso bugueiro (que chamava Binho), mas o coordenador fez questão de apontar que Leo, um senhor de meia idade magro e barbudo, era poliglota, falava Japonês, Inglês, Italiano e um pouco de Francês. E aí o preconceito, que aqui confesso, envergonhado: duvidei. Então, não só fui apresentado, apresentou-se em japonês (que entendo muito pouco, só dos animes) e um inglês fluente, onde então pude bater um papo. Fascinante. Aprendeu as línguas com as mulheres que amou, suas heranças, e com o povo dos países que visitou. E agora dirige turistas a praias paradisíacas de buggy.

Ainda em Porto de Galinhas, conheci o seu Baulo, um pescador, beirando seus 60 anos. Lúcido em sua idade, seu Baulo nos conduziu de jangada até as piscinas naturais que se formam nos arrecifes antes da praia, lugares muito bonitos. No caminho, a maré baixa impediu que ficássemos na jangada, e seguimos a pé. Ao localizar uma das primeiras piscinas, menores, pensei em me lançar ali, e seu Baulo, sabiamente, me impediu: "meu filho, a fruta da beira da estrada é a mais fácil de pegar, mas quase sempre é a menos saborosa, vamos caminhando mais adiante".

No centro de Porto de Galinhas há uma infraestrutura que não existe nos Pontos de Apoio das outras praias. Há bancos, mercados, galerias, várias lojas. É uma pequena cidade fomentada pelo constante e mutante fluxo de turistas. Ao final de nosso passeio, com fome, resolvi provar uma tapioca em uma das salas de uma galeria. Ao chegar, fui recebido por um senhor com um estranho sotaque, familiar e inesperado. Um italiano. Acabou me contando um pouco de sua história, um estrangeiro que comprava biquinis para vender na Europa, e acabou montando uma confecção. Dono de um tino para negócios fenomenal, logo abriu um restaurante também. Diante de ofertas irrecusáveis de sócios, vendeu sua parte em ambos os investimentos e hoje tem uma pequena sala onde vende tapioca (que é também um negócio esperando retorno), e investe, via Internet. E mora em um paraíso tropical.

Tantas faces, histórias e feitos. Lembranças, lições. Acho que a vida é feita exatamente disso, do que nos marca, nos lembra, ensina e define.

17 de fev. de 2017

Sobre pendurar quadros (e ceticismo)

Algum tempo atrás comprei um conjunto de 5 telas com uma imagem muito bonita e nostálgica. As telas foram compradas via Internet e vieram da China, porém o enquadramento foi feito localmente. Os quadros são "frameless" (sem moldura) e se "encaixam" no espaço.


Pendurar estes quadros não foi fácil. A envergadura de 2 metros não ajuda, e centralizar ele com a parede, e o sofá abaixo, é bem complicado. Mas não foi isso que me chamou a atenção ao pendurar esse (e os outros 3 que a esposa me fez pendurar após esse). O que me chamou realmente a atenção foi a imparcial falibilidade de meus sentidos.

Eu pendurei o quadro central primeiro (dã, óbvio, não é?!). Foi um pouco mais fácil, tudo que tive que fazer foi garantir que os dois pregos de suporte estavam na mesma distância do teto (ou seja, que o quadro ficaria reto). Tranquilo. Aí vieram os outros dois. Eu posicionei o da direita, o melhor que pude, e marquei com lápis na parede seus limites. E preguei. E pendurei ele, e estava totalmente errado, basta ver o quadro por trás, onde aparece a madeira que sustenta a tela...


Então, conformado que os furos errados ficariam escondidos, eu medi cuidadosamente a madeira (2,5 cm), e preguei exatamente a essa distância dos furos anteriores, para baixo, e voilá! Tudo encaixou.

Agora pregar o terceiro, não deve ser muito difícil, posiciona, marca, mede, marca, prega. Mas, se está alinhado com o teto, eu posso usar a mesma distância dos pregos da direita. E foi o que eu fiz, medi a distância do teto para os furos da direita, e preguei os da esquerda na mesma distância. E duvidei, da trena. Meu olho me dizia que não tinha COMO o prego ficar ali. Retirando a tela da direita, parecia errado ainda assim. E o quadro alinhou, novamente, muito bem.

O mesmo ocorreu com o quarto e quinto quadros, usei a linha do da direita para medir os furos do da esquerda, e novamente parecia completamente torto, até pendurar a tela e verificar que ficou alinhado.

E qual o motivo de escrever sobre isso? É a conclusão óbvia: somos falhos. Se confiasse no olhômetro, teria repetido várias vezes a tarefa. Criamos instrumentos que superam nossos sentidos o tempo todo. Máquinas que enxergam o que não podemos ver, medem o que não conseguimos mensurar, percebem o imperceptível. Infravermelho, ultravioleta, microondas, radiação, galáxias distantes, até as ondas gravitacionais.

E como o ceticismo se encaixa nisso? O cético acredita em provas, evidência. Se eu criar uma máquina que consegue medir algo previamente não mensurado, e outra pessoa conseguir construir a mesma máquina (ou ligeiramente melhorada) para medir novamente, com melhor grau de precisão, isso é uma prova! Agora, meridianos, espíritos, energia vital (vitalismo), até que medidos e provados, merecem seu lugar, junto com meu quadro, como ficção.

31 de jan. de 2017

Quando "amor" vira pronome

Eu sempre gostei de nossa língua. Acho ela complicada, difícil, indomável, linda e única. Praticamente o mesmo que acho da minha esposa. Falar e escrever nosso português brasileiro é um desafio que encaro todos os dias. Comunicar-se em uma sociedade carente de educação é um desafio, e muitas vezes é preciso decifrar o que seu interlocutor quer dizer, ainda mais quando lidamos com um público diverso que representa uma média interessante da nossa população.

Dito isso, palavras carregam peso. Qualquer comunicação iniciada é um risco calculado, já que palavras podem ser mais pesadas que armas, e como as últimas, uma vez disparadas, não tem como tomá-las de volta. Aprendi isso da única maneira que sei como: errando. Lançando palavras ao vento e observando elas voltarem para destruir algo que construí. E continuo errando! É incrivelmente difícil educar-se a não dizer tudo que pensamos. É incrivelmente prático aprender essa habilidade, mas sua maestria vem apenas com o treino. Acho que não vivi o suficiente ainda.

Não me sinto confortável para entrar nas minúcias linguísticas que caracterizam objetos, advérbios, verbos, artigos, pronomes, substantivos e adjetivos. Mas posso falar sobre o amor. Especialmente quando ele deixa de indicar um sentimento, e passa a indicar uma pessoa. Pior ainda, é quando o usamos para indicar esta pessoa em particular e ele se torna um pronome. Como você, ou tu: amor, me ajude aqui!

É uma intimidade vivida poucas vezes de verdade. Exige tempo, este sim de valor imensurável em nosso mundo frenético. Me perdoem a nostalgia, mas hoje tudo é descartável, fugaz. Música, gostos, amores. Todos fluem rápido em meio ao mundo de informação em que o tempo de atenção máximo é 10 minutos. Eu sinto isso me afetar mesmo sendo de outra geração, quando paro algo que estou fazendo pois exige investir muito tempo. A busca de atalhos tornou a vida uma espécie de fluxo (como a água, ou a eletricidade) em que buscamos constantemente o caminho mais fácil, de menor resistência, mas sem a resiliência que talvez nos permitisse atravessar, aprender e quem sabe, criar. Muitas vezes acabamos desistindo, e todo um investimento vai à ruína pela simples economia de esforço. Pelo medo da mudança. Pelo abandono do "nós", pelo "eu".

Então eu me deparo com o amor, o meu, no caso. E ela está lá, ainda, após anos. Na família, na roda do bar, com os amigos, na hora de me referir a ela: amor. Meu amor! Que êxtase em ter passado tempo suficiente para tornar essa substituição nominal tão natural que nem percebo seu uso. Na verdade foi uma epifania notar isso e escrever esse texto, tamanha surpresa ao analisar esse uso estranho para a palavra.

Então, nessa palavra dita, personificada, reside um sentimento. Esse sentimento confortável pela cumplicidade dos anos, demonstrado em frases o tempo todo, e não paramos para pensar nisso. Essa palavra falada constantemente sem medo das consequências indica um nível de conforto que evidencia um relacionamento tão raro hoje em dia. Quem sabe tomar consciência disso seja saudável. Lembrar do esforço que levou a essa situação, dos frutos incontáveis desse investimento. Da construção linda e reforma constante que exige manter-se unidos.

4 de jan. de 2017

Momentos

Eu sou ateu. Por muito tempo fiquei entre o agnosticismo, que é confortável e a posição preferida entre quem não quer se fixar nesse assunto, e o ateísmo, que sofre preconceito e é considerado falacioso por quem prega o "não ter certeza de nada". Eu até pensei em me definir diferente, tentando ser mais "aberto", mas não dá. A ausência completa de provas que me faz ateu quanto a divindades nórdicas, gregas, romanas, o Monstro de Espaguete Voador e o Bule de Chá Espacial é a mesma que me faz ateu perante o cristianismo, judaísmo e islamismo. Seria hipócrita ser agnóstico a essas idéias e não as outras, como se elas não tivessem o mesmo peso, só pela quantidade absurda de pessoas que acreditam nas últimas. Semanticamente, eu na verdade sou ateu agnóstico, pois sei da minha limitação (e da limitação humana) em provar a existência de divindades, mas isso é difícil de explicar numa conversa informal. Ateu parece até mais agressivo, no estilo: "não tente me convencer e continuamos amigos". Prefiro assim, pois nem todas as pessoas tem a capacidade intelectual de discutir esse assunto, e ter suas crenças atacadas, sem personificar suas idéias e sentir-se ofendidos, levando ao conflito.

Devido a essa posição, e tentando não participar da cultura da "pós-verdade" atual, evitando assim criar uma câmara de eco social (Veritasium explicou isso MUITO bem), eu participo em diversas conversas. Nestas, volta e meia surge a pergunta: Mas se você não acredita em nada, qual o objetivo de viver? Qual a razão para levantar da cama?

Eu pensei MUITO sobre isso. Me considero uma pessoa psicologicamente estável e ainda assim, por muitos anos, isso me causou uma certa ansiedade. É uma resposta muito complexa. Aconteceu o que por vezes deve acontecer com vocês também. Você SABE a resposta, mas não consegue colocar ela em palavras. É difícil. Além disso, é uma pergunta muito pessoal. Muitas pessoas preferem a resposta da religião pois é terrível pensar nisso. É mais fácil aceitar que depois de morto, tudo será explicado, resolvido, e portanto, não pense muito nisso agora, mas pague o dízimo.

Essa semana, caminhando com a minha Schnauzer Miniatura em um dia de sol extremamente bonito (embora quente, muito quente), eu tive uma mini-epifania. Foi muito estranho. Eu pensava exatamente sobre isso, e uma resposta me veio. E ela é simples, não só isso, mas particularmente, ela me tirou um peso, eu PERDI a ansiedade sobre aquela pergunta terrível. Me senti satisfeito com a resposta, e acho que consigo escrever e transmitir ela. Vamos lá.

Nossa vida é feita de momentos. A temporalidade nos impede de ver que tudo vai passar, ou não vai importar mais. O passado, o presente e o futuro são mais que conceitos. O passado são lembranças, o presente é que cria novas lembranças e o futuro são possibilidades. Então, qual o motivo de levantar da cama? Ir trabalhar? Comer, correr, amar?

Para mim, o objetivo é criar momentos. Momentos que fazem tudo valer a pena. Momentos felizes, planejados ou acidentais. Um beijo, um abraço, um aperto de mão. Uma despedida após um reencontro. Mudar de ares, um happy hour. Um churrasco com amigos. Aquela felicidade por ver os outros felizes, a empatia, ajudar e ser ajudado. Conversar, discutir, mudar de opinião e ver que cresceu e melhorou. Olhar ao seu redor e ver o que você construiu. Patrimônio material e imaterial. Suas relações, amores, amizades. Seus feitos, erros e defeitos superados. Até o que de ruim acontece, mas prova que tem muita gente que se preocupa com você. Você marcou pessoas, criou laços estreitos e duradouros. Aquele jogo, aquele empreendimento, aquele projeto. Aquele tempo que você teve para você, para contemplar, ou mesmo jogar fora. Aquelas pessoas especiais.

Se você for religioso, pode aproveitar a comunhão, a convivência, a comunidade e a leveza do elevar espiritual. Se for ateu, pode aproveitar a sublime realização de viver uma realidade explicada cada vez mais em pormenores, e que permite a todos viver mais e melhor. A beleza de tudo, criado por seres humanos ou natural. Eu consigo entrar em uma igreja e sentir a sublime realização do potencial humano inspirado pelo divino, inventado (para mim) e mais real impossível (para o autor).

Esse para mim é o objetivo: criar momentos. E se eu puder, tentar aproveitar esses momentos, alongá-los, se jogar neles e viver intensamente. Mais ainda, compartilhar essa experiência com aqueles ao seu redor e absorver deles o suficiente para criar novos momentos. Fantástico.

Isso acontece no presente, sem ansiedade. É a pureza de se aproveitar o momento enquanto ele se desenrola.

Isso não acontece o tempo todo, e talvez por isso seja tão especial. Você não consegue perseguir esses momentos, mas consegue planejá-los, ou investir neles. Perseguir gera ansiedade e mata a leveza do sentimento espontâneo, mas planejar em si é um momento, e realizar é seu clímax.

E você, qual seu motivo?